sábado, 22 de setembro de 2018

E a cartucheira a ficar sem munições.

Ontem, cedinho (19h30) como convém às respectivas artroses, jantar de 5 velhos amigos, que rápidamente se transfigurou em assentadura geral de 5 amigos velhos. 
Tasca igualmente velha, tal como as panelas que, como sabem, é onde se fazem as boas sopas. Detalhe que nunca é de somenos. 
A circunstância de haver pouca gente também se tornaria particularmente agradável. Assim conseguiríamos entre-ouvir-nos, sem repetições, sempre embaraçosas, porque desmobilizadoras de conversas escorreitas. Acima de tudo queríamos fugir aos lugares "trendy", estranhos e salteadores de bolsos que por aí explodem, numa base diária, como cogumelos. E que, felizmente, nenhum de nós conhece. E não tem a menor intenção de vir a conhecer.
Duas combinações prévias, tomaram a cabeceira da mesa. 
Por um lado, desligar telefones (surpreendentemente, ou não, apenas eu ostentei, quase corado, smartphone - o que me valeu olhar reprovativo, se calhar com razão, dos restantes comensais) e, por outro, proibição absoluta de desperdiçar palavreado em assuntos políticos. O primeiro a fazê-lo, entraria no bizarro mundo do pagador oficial da totalidade do ágape. 
Estou lixado (cogitei, com os meus botões!). 
Estabelecidas as regras, declarámos abertas as hostilidades.
Em comum, os factos de nenhum de nós ter progenitura viva, sermos todos avôs, e mantermos há mais de trinta anos uma amizade (daquelas que já caíram em completo desuso), sólidamente à prova de bala. Em (in)comum, a circunstância de um deles continuar casado com a mesma mulher há bem mais de 150 anos (minha querida R. como é que tu ainda tens pachorra para aturar o bacamarte do teu consorte?) e de outro, ser viúvo. Os restantes, há muito entraram em derrapagem descontrolada, nessas matérias específicas.
Ninguém é perfeito.
Entrámos numa espécie de limbo que nos anestesiou. Tudo, mesmo tudo (excluída a política, está bom de ver, ficaria caríssima), esvoaçou em nosso derredor. Esse tudo, foi sendo temperado com sorrisos, risos, gargalhadas, lágrimas furtivas, até. O excelente cabritinho no forno e a meia-dúzia de Papa Figos, deram uma inestimável ajuda.
O toque de recolher soou às 11 da noite. A idadezinha não perdoa. Fizemos 500 metros a pé. Há, por ali, dois ou três daqueles restaurantes referidos acima. As filas acumulavam-se à porta, à quase-hora da ceia. 
Olhei aquelas caras que faziam transparecer tudo, menos o prazer de uma verdadeira e reconfortante amizade. Concluí em voz alta (talvez uma oitava acima do devido) algo que, pela segunda vez durante a noite me valeu olhares furibundos, desta vez com origem nos "fileiros".
- Fuck them. Estão aqui apenas para fazer trade-off de existências nulas.
Os meus, aquiesceram, em silêncio mais que cúmplice.
Solidário, mesmo.