terça-feira, 11 de setembro de 2018

Amanheceres.

Hoje, no entre-estremunhos de um despertar meio estranho, sentia o que me resta de cabeça, recheada por duas ou três cenas da extraordinária série de dez episódios, concebida para televisão pelo cineasta polaco, Krzysztof Kieslowski. 
O Decálogo. 
Por cada uma das dez leis entregues a Moisés no Monte Sinai, um episódio, alguns deles a preto-e-branco (poderosíssimos), protagonistas sempre diferentes, a que se juntam duas constantes. Sempre o mesmo cenário (um qualquer bairro deprimente de Varsóvia, simbolizando o mundinho, ele próprio deprimente, em que todos nós "vivemos"), e um pedinte que apenas olha e a quem não se ouve um único som em todos os episódios. Nem se torna necessário. Tal a intensidade que põe no olhar.  
Senti-me esmagado pela força da metáfora, escabrosamente premonitória. Tudo lá está. As migrações, as transformações, o medo, o perigo, o racionalismo, a mudança de sexo, a cobardia, a coragem, enfim, tudo o que ele, já em 1989, pressentia que estava à porta. 
À primeira vista, nada que tenha que ver com esta tenebrosa época que nos tocou em sorte (marreca) viver...
Para o que me havia de dar.